
Em todo início de ano, a Globo anuncia o seu "Festival Nacional". Dentre os filmes, um dos que provavelmente pingarão na programação é o "Somos tão jovens", que assisti na metade do ano passado. Como bom conhecedor de Legião (na verdade, de todo o rock brasiliense dos anos 70 e 80), adorei o filme. Mas a maioria dos meus colegas não curtiu tanto. Acharam "superficial", que podia ter explorado mais e melhor a estória de Renato Manfredini e sua trupe, etc. Um deles chegou a dizer que o filme poderia se chamar "Malhação Urbana", por ser um filme muito adolescente para ser direcionado a um público adulto que se diz maduro. Já naquela época, pensei em postar no blog sobre meu ponto de vista, mas estava trabalhando e estudando a rodo e não me soou interessante fazer uma crítica que não fosse a uma revista e que não me revertesse uma renda por isso. O anúncio do filme na TV paga e, posteriormente, na aberta, conjugados ao tempo livre pra alimentar a página, me fizeram retomar a ideia, mas tomando-se o filme como ponto de partida para uma análise mais profunda sobre comportamento e cânone musical (lembrando que eu deixei uma postagem anterior de preparação para esta; recomendo a ler antes).
Para quem ainda não assistiu o filme (ATENÇÃO: SPOILERS!), basta dizer que o mesmo retrata como Renato Russo se apaixonou pela música, teve contato com a cena punk de Brasilia que se formou com o acesso que os "filhos de generais" tiveram aos discos importados da cena inglesa de 77, criou sua primeira banda, o Aborto Elétrico, virou trovador solitário após o fim da mesma, até a consolidação da primeira formação do Legião Urbana que gravaria o álbum de estreia em 1984. Entre seus amigos da cena, Herbert Vianna, Dinho Ouro Preto, os irmãos Lemos e outras figuras tarimbadas do rock oitentista.
Apesar de, em alguns momentos, ficar muito musical / videoclíptico, gostei muito do filme. E o primeiro motivo foi justamente o que fez a maioria do pessoal odiá-lo: Ele mostrou um filme com personagens jovens. No sentido de "pessoas em formação". De imaturidade.
Fere muito o ego de legiomaníacos de todo o Brasil ver um Renato Russo que briga por besteiras e infantilidades, invade festas burguesas pra tocar punk só pra causar (alguém aí lembrou dos nossos "rolezinhos" de 2013? Só trocar o "p" pelo "f", né gente?), dança sozinho em frente ao espelho que nem um retardado (como os góticos do Madame Satã dançando em frente à parede), faz cú doce pra tocar em certos lugares, troca um show por um ritual solitário de homenagem ao falecimento de John Lennon e grava escondido conversas de amigos adolescentes para delas tirar inspiração para suas músicas. Porque ele é o Renato Russo, compositor das músicas que mudaram e marcaram milhares de vidas, tiraram vários jovens do pagode e do axé para o rock intelectual (acredito que foi a partir da última fase do Legião que a expressão "roqueiro moralista" começou a deixar de ser um paradoxo), enfim, o poeta de toda uma geração Coca-Cola / All-Star. Que era, de fato, um moleque chato pra caralho! E, mesmo maduro e já consciente de sua morte próxima, ainda permanece um pouco "metido", como se percebe nesta entrevista pra MTV em 1994. Curiosamente, os outros personagens, mesmo bem caracterizados enquanto jovens, não soaram tão imperfeitos, instáveis ou mesmo caricatos quanto Renato. O Dinho, por exemplo, se saiu um boa-praça com quem seria ótimo trombar e ficar trocando ideia tomando uma cerva numa sexta à noite.
O segundo motivo não está relacionado diretamente ao filme, mas ao seu contexto: as reações do público e os diálogos com o tempo / espaço do período de seu lançamento. Adorei o filme pela forma como sua presença trouxe à tona o cenário atual do rock brasileiro em produção e público.
O rock brasileiro começou nos anos 60, com a chamada jovem guarda. Como um ritmo que ganhou sucesso rapidamente seguindo a fórmula popularizada pelos Beatles (gente bonita com talentos musicais básicos que cantavam sobre amor de maneira simples e direta - costumo provocar os dinossauros dizendo que os Beatles foram a 1ª boy band do mundo), sofreu uma grande perseguição de outros nichos cultural-musicais, sobretudo o público da MPB e da Bossa Nova, no mesmo nível que o funk e o sertanejo universitário sofrem hoje. Os puristas defendiam a proteção da legítima música brasileira (apoiando inclusive uma marcha contra a guitarra elétrica) e condenavam nos jovens o uso de drogas (como a maconha e os chás de cogumelo) e a perda da virgindade antes do casamento. A quebra deste estigma começa somente com as apresentações de Caetano Veloso e Gilberto Gil juntamente com o grupo experimentalista Os Mutantes nos idos de 1969 (é de se lembrar também o momento em que Caetano soltou o seu famoso discurso após a canção "É proibido proibir")
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Beijinho no ombro pra galera que se acha o máximo porque só curte rock e MPB! |
A Jovem Guarda murchou nos anos 70, época em que o fardo do rock sobrou para apenas dois herdeiros: Raul Seixas, da Jovem Guarda, e Rita Lee, do experimental. Claro, seus estilos evoluíram e se modificaram até se transformarem em suas marcas registradas híbridas. Mas era o pouco que tinha de rock dito "de prestígio" na década: enquanto bandas legitimamente autointituladas roqueiras como Made in Brazil e Casa das Máquinas sobreviviam em uma espécie de "underground" protourbano, a influência das jovens tardes permanecia em uma leva de brasileiros cantando músicas românticas em inglês (The Light Reflections, Pholhas, Chrystian - isso, aquele que depois foi fazer dupla com o Ralf!), popularizando o que viria a ser a "música de bailinho de garagem".
Quando o punk veio parar no Brasil no final dos anos 70 (portanto, um pouquinho atrasado em relação à febre disco), o rock em si já não era uma novidade. Mas era, de fato, um estilo ainda mais pesado do que suas fases antecessores. E falava em anarquia em oposição à monarquia do Reino Unido, país de origem da cena. Claro, o Brasil não era uma monarquia. Mas era um regime ditatorial disfarçado de democracia indireta presidida por um colégio eleitoral militar. E era MUITO mais pobre do que o arquipélago britânico. A atitude punk aqui seria reinventada, fosse pelos "filhos de generais" brasilienses que só queriam subverter a estética da elite que estava lhes criando, fosse pelos proletários dos subúrbios paulistas protestando por melhores salários e condições de trabalho (talvez seja esta a reinvenção mais importante, conforme prega o documentário Botinada), fosse pelos surfistas cariocas que mantinham contato com turistas anglófonos jovens que vinham de onde todo o buzz rolava.
É neste cenário que surge a geração oitentista retratada no filme. E, para o grande público, é como se nela o verdadeiro rock brasileiro tivesse nascido, sendo ignorada toda a história anteriormente citada. E, até hoje, muita gente se diz fã de Legião Urbana, Titãs, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso, Ultraje a Rigor, Plebe Rude, entre outros. Claro, se apoiando nos sucessos do passado. Mas o que esta cena está produzindo hoje?
A minha visão não é nem um pouco animadora. Herbert Vianna, apesar do heroísmo na superação do acidente que o deixou paraplégico, tem enormes dificuldades para cantar e tocar. E os novos singles dos Paralamas, por melhor produzidos que sejam, não ficam nem 2 semanas nas rádios. No último show que fui dos caras, sentia que a maioria estava lá meio que por educação e respeito, fora passar boa parte do tempo esperando "a sua música favorita". Ir a um show pra ficar parado como se estivesse apreciando um quadro sonoro em movimento me soa perda de tempo ultimamente. O Barão se aposentou de vez, não sem antes explorar horrores a ligação com Cazuza (resgatar gente que morre no auge sempre dá ibope, né?). Capital e Titãs tentam o tempo todo recuperar os espíritos das "origens", mas suas éticas midiáticas atuais não lhes permitem mais isso, e seus trabalhos novos acabam desagradando a gregos e troianos. O Ultraje a Rigor virou banda de fundo de um talk-show e tem de dar "graças a Deus" por estar na mídia diariamente ainda que desta forma. Nem falo das bandas que se reúnem uma vez a cada 2 anos ou gravam um "acústico" só pra complementar suas aposentadorias.
Enquanto isso, Dado, Bonfá e a família Manfredini vão vivendo de (média) renda soltando aos poucos material consumível pelos fâs da Legião, além de autorizar usos de imagens e músicas. Grosso modo, podemos contar 1 acústico, 2 shows gravados em CD, 1 coletânea de maiores sucessos, 2 trabalhos póstumos solo de Renato, 4 músicas em trilhas sonoras de filmes (sendo que uma acabou rendendo uma reunião de Dado e Bonfá tendo o ator Wagner Moura como vocalista, numa atuação "para ser esquecida"), 1 comercial de operadora de telefonia celular propagado indevidamente como "filme" e os 2 verdadeiros filmes: o de objeto da crítica e o aclamadíssimo Faroeste Caboclo, este sim adorado por crítica e público simultaneamente. Música que é bom, nada. Nem tocando, nem produzindo outras bandas.
Aí os "fãs" vão dizer: mas todos eles já fizeram o que tinham de fazer pra entrarem pra história, não têm de provar mais nada pra ninguém. Até certo ponto, é verdade. Mas porque a maior parte das bandas inicia seu sucesso cumprindo seus papéis majoritários de MC's (mestres de cerimônia, ou seja, responsáveis pela animação de uma festa) e, após perder esta capacidade primária, se coloca num estado de "música-arte", se achando num direito de manter um agrupamento de fãs incondicionais e de ser cultuada e admirada pelos méritos da fase de ouro, independentemente da produção atual, que geralmente foge ao diálogo com o contexto contemporâneo? Pra complementar esta pergunta, transfiro o foco crítico dos artistas para o público ensejando duas questões:
1 - Não é consideravelmente "poser" se dizer fã de um determinado grupo ou artista quando na verdade apenas curte a "fase de ouro" antiga dos mesmos e não consome (material ou ideologicamente) mais nada das produções novas, quando estas existem?
2 - Não seria atualmente o fanatismo (pelo menos dentro do rock) uma coisa datada, ultrapassada?
Digo isso porque a última "onda" mais popular do rock nacional (excluindo-se da análise, ad hoc, todas as outras fases compreendidas os anos 80 e a atualidade) foi justamente a mais odiada pelos roqueiros em geral: o emo! Claro que não estou falando necessariamente do emo que nasce nos EUA com bandas como Millencollin e MxPx, influencia a produção de grupos nacionais como CPM22 e Detonautas e atinge seu ápice no Dance of Days (blargh!), mas do que erroneamente se popularizou como emo: NXZero, Fresno, Hori, Strike e outros grupos de rock comercial que entraram em voga JUSTAMENTE após o fim da Rádio Rock (89,1 SP - que não deixa de ser uma referência NACIONAL, o que me faz pensar em uma estranha "coincidência").
O que se generalizou como emo tem a ver com o fato de que as gravadoras fizeram uma "redescoberta" nos anos 2000: sim, os roqueiros também amam. Amam, trepam, traem, terminam, ficam com dor de corno e tentam voltar arrependidos. O "falar de amor", tão condenado no pagode, agora invade o rock, com uma poética mais "enrustida" e galãzinhos tatuados batendo bicordes - praticamente a mesma essência da geração Beatle / Jovem Guarda, com algumas evoluções.
Para a maior parte dos roqueiros das gerações 80 e 90 - que se emputeceu com essa galera ditando estéticas inatingíveis e falando de maneira poeticamente indireta sobre galinhagem juvenil (tipo dizer que vai morrer ou se matar se não der mais uma bombada pra ver se rola de reatar o namoro, porque não é todo dia que a gente consegue sexo de graça, né?) e que conseguiu o que se pode considerar o último impulso de fanatismo do rock nacional, com presença em capas de revistas adolescentes, comunidades com milhões de membros no Orkut, entre outros indícios - restou o refúgio nos astros do passado (como se as bandas nacionais dos anos 60, a maioria das bandas internacionais que fizeram sucesso aqui e a própria Legião Urbana e outros oitentistas também não falassem de "amor", de maneiras diferentes), a internet, as baladas e mídias alternativas (em especial a MTV brasileira) e o "underground". Mas estes 3 últimos meios parecem ter sido mais benéficos para bandas e públicos: Matanza, Velhas Virgens, Pedra Letícia, Os Seminovos, O Teatro Mágico, entre outros grupos (principalmente os da cena "Baixa Augusta"), tinham linguagens e liberdades muito próprias que o mainstream não conseguiria modificar para depois expor. E SÓ AGORA estão começando a modificar um pouco.
Em 2013, com a volta da Radio Rock em 89,1 SP através do grupo UOL, o estilo musical voltou a ser tema de discussão na mídia, apesar de este mesmo grupo ter noticiado uma espécie de "atestado de óbito" do rock nacional no Prêmio Multishow deste mesmo ano. E um dos fatos notáveis desta retomada de pauta foi justamente o filme em questão, que fez muita gente lamentar o fato de ele não abarcar a grandeza que foi o cenário roqueiro oitentista cultuado por jovens e adultos até hoje.
Neste início de 2014, estes roqueiros jovens e adultos são os mesmos que condenam a popularização excessiva das camisas de bandas como Ramones, Black Sabbath e AC/DC, que tiram sarro de quem ouve Legião Urbana com a mesma liberdade que ouve Jorge & Mateus, Anitta, Thiaguinho e Aviões (vide lista de artistas mais ouvidos do letras.mus.br), que pararam de ouvir Paralamas do Sucesso após verem Herbert Vianna doar sua guitarra para Chimbinha, da Banda Calypso, que não aceitam que o metal melódico do Angra sirva de influência para o axé do Parangolé ou o tecnoforró do Calcinha Preta, que tão logo exaltam a produção de uma banda largam mão dela quando passa a ser curtida por gente que não faz parte de seu nicho sociocultural (dizendo que "virou modinha" ou "tá babado").
Em resumo, são aqueles que, com uma postura dita indie, reclamam da falta de popularidade do rock, mas colaboram para a formação de um estereótipo negativo de roqueiro e, consequentemente, agem para que o rock continue sendo impopular. Há uma contradição entre o discurso e a atitude. Com o prestígio em queda na atualidade, recorrem cada vez mais ao passado de glórias, num ciclo de nostalgia e escapismo, temas já abordados anteriormente neste blog.
Enfim, o filme acaba revelando um público que não gostou do filme por ser "imaturo", mas que também não sabe lidar com as próprias imaturidades e também não reconhece as que permeiam as diferentes fases que o rock atravessou no Brasil e no mundo. Que ainda mantém um certo dogmatismo, preferindo ignorar conhecimentos e informações que a internet disponibiliza hoje com uma grande facilidade, fazendo com que surjam posições críticas contraditórias e falaciosas que não reconhecem essências comuns entre diferentes estéticas. Que, em matéria de rock, fica preso no passado e esquece de construir o presente e valorizar e apoiar quem o faz, mesmo que de maneira um pouco diferente da que se esperava, considerando-se evoluções em pensamento, comportamento e arte.
Não é uma questão de desprezar o passado. Ele é o fundamento, a base diacrônica. Mas, como em uma árvore, o que é galho hoje fará parte do tronco amanhã, e é natural que algumas folhas caiam para que delas surjam outros galhos que darão novas folhas e frutos. Alguns, naturalmente, nascerão defeituosos, secarão ou serão comidos pelos insetos. Mas a árvore em si continua viva. Acredito que o público do rock nacional hoje deve passar da exclusão para o acolhimento, da "devolução" do bullying para a compreensão, e buscar um equilíbrio ideal entre o mainstream e o underground, em prol da própria manutenção do estilo, que vem perdendo espaço constantemente. Também não tô dizendo pra galera voltar a curtir emo (pessoalmente também considero uma fase "pra ser esquecida"), mas esta fase acabou sendo a prova de que o rock pode voltar a ser popular, discutindo-se antes a relativíssima mas necessária questão qualidade. É necessário, acima de tudo, bom senso. E bom senso não se aprende nem se ensina na escola. Nem mesmo na Escola do Rock.
Digo isso porque a última "onda" mais popular do rock nacional (excluindo-se da análise, ad hoc, todas as outras fases compreendidas os anos 80 e a atualidade) foi justamente a mais odiada pelos roqueiros em geral: o emo! Claro que não estou falando necessariamente do emo que nasce nos EUA com bandas como Millencollin e MxPx, influencia a produção de grupos nacionais como CPM22 e Detonautas e atinge seu ápice no Dance of Days (blargh!), mas do que erroneamente se popularizou como emo: NXZero, Fresno, Hori, Strike e outros grupos de rock comercial que entraram em voga JUSTAMENTE após o fim da Rádio Rock (89,1 SP - que não deixa de ser uma referência NACIONAL, o que me faz pensar em uma estranha "coincidência").
O que se generalizou como emo tem a ver com o fato de que as gravadoras fizeram uma "redescoberta" nos anos 2000: sim, os roqueiros também amam. Amam, trepam, traem, terminam, ficam com dor de corno e tentam voltar arrependidos. O "falar de amor", tão condenado no pagode, agora invade o rock, com uma poética mais "enrustida" e galãzinhos tatuados batendo bicordes - praticamente a mesma essência da geração Beatle / Jovem Guarda, com algumas evoluções.
Para a maior parte dos roqueiros das gerações 80 e 90 - que se emputeceu com essa galera ditando estéticas inatingíveis e falando de maneira poeticamente indireta sobre galinhagem juvenil (tipo dizer que vai morrer ou se matar se não der mais uma bombada pra ver se rola de reatar o namoro, porque não é todo dia que a gente consegue sexo de graça, né?) e que conseguiu o que se pode considerar o último impulso de fanatismo do rock nacional, com presença em capas de revistas adolescentes, comunidades com milhões de membros no Orkut, entre outros indícios - restou o refúgio nos astros do passado (como se as bandas nacionais dos anos 60, a maioria das bandas internacionais que fizeram sucesso aqui e a própria Legião Urbana e outros oitentistas também não falassem de "amor", de maneiras diferentes), a internet, as baladas e mídias alternativas (em especial a MTV brasileira) e o "underground". Mas estes 3 últimos meios parecem ter sido mais benéficos para bandas e públicos: Matanza, Velhas Virgens, Pedra Letícia, Os Seminovos, O Teatro Mágico, entre outros grupos (principalmente os da cena "Baixa Augusta"), tinham linguagens e liberdades muito próprias que o mainstream não conseguiria modificar para depois expor. E SÓ AGORA estão começando a modificar um pouco.
Em 2013, com a volta da Radio Rock em 89,1 SP através do grupo UOL, o estilo musical voltou a ser tema de discussão na mídia, apesar de este mesmo grupo ter noticiado uma espécie de "atestado de óbito" do rock nacional no Prêmio Multishow deste mesmo ano. E um dos fatos notáveis desta retomada de pauta foi justamente o filme em questão, que fez muita gente lamentar o fato de ele não abarcar a grandeza que foi o cenário roqueiro oitentista cultuado por jovens e adultos até hoje.
Neste início de 2014, estes roqueiros jovens e adultos são os mesmos que condenam a popularização excessiva das camisas de bandas como Ramones, Black Sabbath e AC/DC, que tiram sarro de quem ouve Legião Urbana com a mesma liberdade que ouve Jorge & Mateus, Anitta, Thiaguinho e Aviões (vide lista de artistas mais ouvidos do letras.mus.br), que pararam de ouvir Paralamas do Sucesso após verem Herbert Vianna doar sua guitarra para Chimbinha, da Banda Calypso, que não aceitam que o metal melódico do Angra sirva de influência para o axé do Parangolé ou o tecnoforró do Calcinha Preta, que tão logo exaltam a produção de uma banda largam mão dela quando passa a ser curtida por gente que não faz parte de seu nicho sociocultural (dizendo que "virou modinha" ou "tá babado").
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"Sério que Ramones não é uma marca de camisa?" |
Em resumo, são aqueles que, com uma postura dita indie, reclamam da falta de popularidade do rock, mas colaboram para a formação de um estereótipo negativo de roqueiro e, consequentemente, agem para que o rock continue sendo impopular. Há uma contradição entre o discurso e a atitude. Com o prestígio em queda na atualidade, recorrem cada vez mais ao passado de glórias, num ciclo de nostalgia e escapismo, temas já abordados anteriormente neste blog.
Enfim, o filme acaba revelando um público que não gostou do filme por ser "imaturo", mas que também não sabe lidar com as próprias imaturidades e também não reconhece as que permeiam as diferentes fases que o rock atravessou no Brasil e no mundo. Que ainda mantém um certo dogmatismo, preferindo ignorar conhecimentos e informações que a internet disponibiliza hoje com uma grande facilidade, fazendo com que surjam posições críticas contraditórias e falaciosas que não reconhecem essências comuns entre diferentes estéticas. Que, em matéria de rock, fica preso no passado e esquece de construir o presente e valorizar e apoiar quem o faz, mesmo que de maneira um pouco diferente da que se esperava, considerando-se evoluções em pensamento, comportamento e arte.
Não é uma questão de desprezar o passado. Ele é o fundamento, a base diacrônica. Mas, como em uma árvore, o que é galho hoje fará parte do tronco amanhã, e é natural que algumas folhas caiam para que delas surjam outros galhos que darão novas folhas e frutos. Alguns, naturalmente, nascerão defeituosos, secarão ou serão comidos pelos insetos. Mas a árvore em si continua viva. Acredito que o público do rock nacional hoje deve passar da exclusão para o acolhimento, da "devolução" do bullying para a compreensão, e buscar um equilíbrio ideal entre o mainstream e o underground, em prol da própria manutenção do estilo, que vem perdendo espaço constantemente. Também não tô dizendo pra galera voltar a curtir emo (pessoalmente também considero uma fase "pra ser esquecida"), mas esta fase acabou sendo a prova de que o rock pode voltar a ser popular, discutindo-se antes a relativíssima mas necessária questão qualidade. É necessário, acima de tudo, bom senso. E bom senso não se aprende nem se ensina na escola. Nem mesmo na Escola do Rock.
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Pois é... saber de música ajuda bastante. Mas SENTI-LA ainda é o principal! |
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