quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Resgatando uma crítica perdida de "Gente grande" em algum recôndito da internet...

Salve galeraaaaaa!!! Hoje é dia de flashback!!!

Estava eu tentando resgatar meu histórico do Orkut pelo Google Takeout. Não o consegui. Porém, encontrei algo que estava praticamente esquecido nos recônditos da internet: meu perfil no STOA, a rede social da USP! E não é que encontrei lá a primeira crítica de filme que fiz para a Áporo, a revista dos alunos do curso de Letras? Foi bom ver como eu escrevia à época. Assim, como faz tempo que não posto uma coisa diferente (já que o foco atual são as gravações do BCAA Project, o qual vocês conhecerão mais tarde), segue esta crítica ao filme "Gente grande" publicada em 2010!


A geração "kidult" (ou "criançulta", se preferir) vai ao paraíso em "Gente grande"


Guarde o termo do título acima; criado por Frank Furedi, sociólogo de Kent, define um zeitgeist (espírito da época, em alemão) compartilhado entre indivíduos adultos que conservam e/ou resgatam elementos concretos e/ou abstratos de fases como a infância e a adolescência em espaços públicos e/ou privados. Nota-se a semi-filosofia, por exemplo, em mães que têm coleções de Barbies e artigos da Hello Kitty maiores que as das filhas, passando pelas camisas de jogos como Super Mario e Pac-Man até flashmobs (reproduções coletivas combinadas usualmente via internet) de episódios marcantes do Pica-Pau e do Chaves.

Mas, como tudo que faz parte da vida urbana, o que era antes uma válvula de escape espontânea compartilhada por poucos virou "modinha" e, consequentemente, alvo de diversos segmentos de mercado, no que se refere a estímulo de consumo. E uma das manifestações mais perceptíveis está na produção cinematográfica hollywoodiana contemporânea: filmes de leitura polissêmica e polinivelada, para a família toda assistir e cada membro gostar de algumas coisas que entendeu (e esquecer das outras que não entendeu ou não gostou).

"Gente Grande", que traz Adam Sandler como roteirista e ator principal (ou seja, idealizador egoistamente majoritário do filme), intenta atingir o ápice da desta recente escalada kidult das telas, iniciada na série "Shrek" e no filme "De repente 30", e é claro que muita gente se irrita e se desconforta ao perceber como a transformação de uma determinada fórmula que deu certo em clichê e sua repetição até a exaustão são inevitáveis dentro de (e para) uma determinada maioria (estamos olhando fora da USP, OK?).

Na pauta principal, uma equipe de basquete colegial (na qual o jovem Lenny Feder, vivido adulto por Adam, é capitão e cestinha) vence um jogo no último segundo em um lance supostamente mal-interpretado pelo juiz, mas para o qual ninguém liga a não ser o time perdedor. O treinador comemora o título com seu time em uma casa no lago, momento marcante na vida dos jovens vencedores. 30 anos depois, o treinador morre e seus ex-discípulos, cada um em um rumo de vida diferente, se reencontram e decidem prestar uma última homenagem passando o feriado prolongado de 4 de julho nesta casa, onde tuas cinzas serão jogadas. Entram em cena os resultados individuais dos desafios de lidar com filhos, carreira, amor, entre vitórias e derrotas da vida e, apesar das diferenças atuais, os jogadores e suas famílias têm um feriado "dos sonhos", onde revivem suas infâncias e tentam compartilhá-las com seus filhos, numa oposição entre brincadeiras naturais e artificiais.

Pontos polêmicos:

- Os membros adultos do time infantil (considere-se o peso da equipe de Sandler: Kevin James, Chris Rock, Rob Schneider e David Spade) vivem zoando uns aos outros, quase sempre beirando o inadmissível. O que hoje se nomeia como "bullying" é tratado no filme como aceitável, desde que dentro de limites. Mas não há uma demarcação formal destes limites. Quando muito, há uma "intuição coletiva", de desafiadora percepção/teorização;

- Em algumas cenas, o filme valoriza a esperteza e a malandragem nociva (como a furada de fila no parque aquático), mas também não dá pra esquecer que, usualmente, quem reclama das duas não as têm o suficiente para não ser prejudicado pelas dos outros.

Pontos negativos:

- Apesar do já citado elenco masculino de peso, o "humorômetro" do filme não alcança os de algumas das produções individuais de seus membros, ou seja, os potenciais poderiam se somar sem precisar ser tirada uma "média" para o filme;

- O elenco feminino é mero coadjuvante (pra quem já foi Frida Kahlo, Salma Hayek, que vive no filme a esposa de Lenny Feder, está quase apagada - o que se dirá das outras?), o que dá ao filme ares do tradicional machismo norte-americano (definição apenas para fins estéticos).

Pontos positivos:

- A trilha sonora é uma das melhores que já vi - e eu nem sou fã de trilhas sonoras! Regada a muitos clássicos do rock americano, considerados "lados B" aqui no Brasil. Quem aposta "deizão" comigo que a KISS FM vai tocar as músicas desta trilha durante o mês de outubro todo? Segue a lista pra você se lambuzar no Soulseek:

Come Back - J Geils Band
Devil Woman - Cliff Richard
Raga For A Whale - Kamal Engels
I'm A Gangsta - Global Operator featuring Mike West
Ave Maria - Franz Schubert
Still Dreaming - The After After Hours
To The Night - The After After Hours
Last Child - Aerosmith
A Life Of Illusion - Joe Walsh
A Night Like This - The Romantics
Love Is Alive - Gary Wright
I Could Be Good For You - Seven O Seven
When Things Go Wrong - Robin Lane & The Chartbusters
Rock And Roll Never Forgets - Bob Seger & The Silver Bullet Band
I Still Want You - The Del Fuegos
Lay It On The Line - Triumph
Escape (The Piña Colada Song) - Rupert Holmes
Walk All Over You - AC/DC
Time For Me To Fly - REO Speedwagon
Just Can't Wait - J Geils Band
Ready For Love - Bad Company
Come And Get Your Love - Redbone
Goodnight Tonight - Paul McCartney
Just Got Back - Cheap Trick
The Party's Over (Hopelessly in Love) - Journey
Sentimental Lady - Bob Welch
Monday Morning - Fleetwood Mac
Two Tickets To Paradise - Eddie Money
I Do - J Geils Band
Every #1's a Winner - Hot Chocolate
Better Things - The Kinks
American Fun - The Stompers
Count On Me - Jefferson Airplane

- A trama do filme não faz a tradicional "parábola" (apresentação, amplificação, epifania e desfecho); assemelha-se mais à uma longa montanha russa, com suas horas de gritar (momentos cômicos) e respirar (momentos mais sérios). Menos emoção, mas mais verossimilaridade, o que já foge "um pouco" de Hollywood (porque esta também é uma formulinha que já está sendo explorada).

Enfim, o filme tem tudo pra ser um bom programa pras famílias lideradas por kidults, e um sério candidato à Sessão da Tarde (com algumas ediçõezinhas) dentro de 2 anos; um regular engraçadinho. Cabe mencionar, ainda que matéria subjetiva, que a pessoa que me convidou para o programa não é tão crítica em matéria de arte audiovisual e literária, mas nem por isso é menos inteligente. E que, ainda que eu curta mais os "unicools" da vida, isto não me torna saudosista, reaça ou discriminador. E, mesmo que apenas visando entretenimento próprio e compartilhamento de conteúdo, coloquei aqui em prática uma lição que alguns críticos ou pseudo-críticos esquecem: absorva/sinta primeiro, fale depois.

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